segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Antes tarde do que nunca

Lembram do Pr. Piragine e seu discurso, que inclusive foi comentado aqui nesse blog?

Pois então, a Aliança de Batistas do Brasil respondeu a essa fanfarronice. Pena que eu encontrei essa resposta somente agora. Entretanto, para não deixar passar em branco, publico aqui mesmo assim. Ela segue integral abaixo, e os grifos, para auxiliar na leitura das pessoas sem paciência para tanto texto, são meus:


"ELEIÇÕES 2010: PRONUNCIAMENTO DA ALIANÇA DE BATISTAS DO BRASIL

A Aliança de Batistas do Brasil vem, por meio deste documento, reafirmar o compromisso histórico dos batistas, em todo o mundo, com a liberdade de consciência em matéria de religião, política e cidadania. A paixão pela liberdade faz com que, como batistas, sejamos um povo marcado pela pluralidade teológica, eclesiológica e ideológica, sem prejuízo de nossa identidade. Dessa forma, ninguém pode se sentir autorizado a falar como “a voz batista”, a menos que isso lhe seja facultado pelos meios burocráticos e democráticos de nossa engrenagem denominacional.

Em nome da liberdade e da pluralidade batistas, portanto, a Aliança de Batistas do Brasil torna pública sua repulsa a toda estratégia político-religiosa de “demonização do Partido dos Trabalhadores do Brasil” (doravante PT). Nesse sentido, a intenção do presente documento é deixar claro à sociedade brasileira duas coisas: (1) mostrar que tais discursos de demonização do PT não representam o que se poderia conceber como o pensamento dos batistas brasileiros, mas somente um posicionamento muito pontual e situado; (2) e tornar notório que, como batistas brasileiros, as ideias aqui defendidas são tão batistas quanto as que estão sendo relativizadas.

1. A Aliança de Batistas do Brasil é uma entidade ecumênica e dedicada, entre outras tarefas, ao diálogo constante com irmãos e irmãs de outras tradições cristãs e religiosas. Compreendemos que tal posicionamento não fere nossa identidade.

Do contrário, reafirma-a enquanto membro do Corpo de Cristo, misteriosamente Uno e Diverso. Assim, consideramos vergonhoso que pastores e igrejas batistas histórica e tradicionalmente anticatólicos, além de serem caracterizados por práticas proselitistas frente a irmãos e irmãs de outras tradições religiosas de nosso país, professem no presente momento a participação em coalizões religiosas de composição profundamente suspeita do ponto de vista moral, cujos fins dizem respeito ao destino político do Brasil.

Vigoraria aí o princípio apontado por Rubem Alves (1987, p. 27-28) de que “em tempos difíceis os inimigos fazem as pazes”? Com o exposto, desejamos fazer notória a separação entre os interesses ideológicos de tais coalizões e os valores radicados no Evangelho. Por não representarem a prática cotidiana de grande fração de pastores e igrejas batistas brasileiras, tais coalizões deixam claro sua intenção e seu fundo ideológico, porém, bem pouco evangélico. Logrado o êxito buscado, as igrejas e os pastores batistas comprometidos com as coalizões “antipetistas” dariam continuidade à prática ecumênica e ao diálogo fraterno com a Igreja Católica, assim como com as demais denominações evangélicas e tradições religiosas brasileiras? Ou logrado o êxito perseguido, tais igrejas e pastores retornariam à postura de gueto e proselitismo que lhes marcam histórica e tradicionalmente?

2. Como entidade preocupada e atuante em face da injustiça social que campeia em nosso país desde seu “descobrimento”, a Aliança de Batistas do Brasil sente-se na obrigação de contradizer o discurso que atribui ao PT a emergente “legalização da iniquidade”. Consideramos muito estranho que discursos como esse tenham aparecido somente agora, 30 anos depois de posicionamentos silenciosos e marcados por uma profunda e vergonhosa omissão diante da opressão e da violência a liberdades civis, sobretudo durante a ditadura militar (1964-1985). Estranhamos ainda que tais discursos se irmanem com grupos e figuras do universo político-evangélico maculadas pelo dinheiro na cueca em Brasília, além da fatídica oração ao “Senhor” (Mamon?).

Estranhamos ainda que tais discursos não denunciem a fome, o acúmulo de riqueza e de terras no Brasil (cf. Isaías 5,8), a pedofilia no meio católico e entre pastores protestantes, como iniquidades há tempos institucionalizadas entre nós.

Estranhamos ainda que tais discursos somente agora notem a possibilidade da legalização da iniquidade nas instituições governamentais, e faça vistas grossas para a fatídica política neoliberal de FHC, além da compra do congresso para aprovar a reeleição. Estranhamos que tais discursos não considerem nossos códigos penal e tributário como iniquidades institucionalizadas. Os exemplos de como a iniquidade está radicalmente institucionalizada entre nós são tantos que seriam extenuantes. Certamente para quem se domesticou a ver nas injustiças sociais de nosso Brasil um fato “natural”, ou mesmo como a “vontade de Deus”, nada do mencionado antes parece ser iníquo. Infelizmente!

3. Como entidade identificada com o rigor da crítica e da autocrítica, desejamos expressar nosso descontentamento com a manipulação de imagens e de informações retalhadas, organizadas como apelo emocional e ideológico que mais falseia a realidade do que a apreende ou a esclarece. Textos, vídeos, e outros recursos de comunicação de massa, devem ser criteriosamente avaliados. Os discursos difamatórios tais como os que se dirigem agora contra o PT quase sempre se caracterizam por exemplos isolados recortados da realidade.

Quase sempre, tais exemplos não são representativos da totalidade dos grupos e das ideologias envolvidas. Dito de forma simples: uma das armas prediletas da difamação é a manipulação, que se dá quase sempre pelo uso de falas e declarações retiradas do contexto maior de onde foram emitidas. Em lugar de estratégias como essas, que consideramos como atentados à ética e à inteligência das pessoas, gostaríamos de instigar aos pastores, igrejas, demais grupos eclesiásticos e civis, o debate franco e aberto, marcado pelo respeito e pela honestidade, mesmo que resultem em divergências de pensamento entre os participantes.

4. A Aliança de Batistas de Brasil é uma entidade identificada com a promoção e a defesa da vida para toda a sociedade humana e para o planeta. Mas consideramos também que é um perigo quando o discurso de defesa da vida toma carona em rancores de ordem política e ideológica.

Consideramos, além disso, como uma conquista inegociável a laicidade de nosso estado. Por isso, desconfiamos de todo discurso e de todo projeto que visa (re)unir certas visões religiosas com as leis que regem nossa sociedade. A laicidade do estado, enquanto conquista histórica, deve permanecer como meio de evitar que certas influências religiosas usurpem o privilégio perante o estado, e promova assim a segregação de confissões religiosas diferentes. É mister recordar uma afirmação de um dos grandes referenciais teológicos entre os batistas brasileiros, atualmente esquecido: “Os batistas crêem na liberdade religiosa para si próprios. Mas eles crêem também na igualdade de todos os homens. Para eles, isso não é um direito; é uma paixão. Embora não tenhamos nenhuma simpatia pelo ateísmo, agnosticismo ou materialismo, nós defendemos a liberdade do ateu, do agnóstico e do materialista em suas convicções religiosas ou não-religiosas” (E. E. Mullins, citado por W. Shurden).

Nossa posição está assentada na convicção de que o Evangelho, numa dada sociedade, não deve se garantir por meio das leis, mas por meio da influência da vida nova em Jesus Cristo. Não reza a maior parte das Histórias Eclesiásticas a convicção de que a derrota do Cristianismo consistiu justamente em seu irmanamento com o Império Romano? Impor a influência de nossa fé por meio das leis do Estado não é afirmar a fraqueza e a insuficiência do Evangelho como “poder de Deus para a salvação de todo o que crê”? No mais, em regimes democráticos como o Estado brasileiro, existem mecanismos de participação política e popular cuja finalidade é a construção de uma estrutura governamental cada vez mais participativa. Foi-se o tempo em que nossa participação política estava confinada à representatividade daqueles em quem votamos.

5. A Aliança de Batistas do Brasil se posiciona contra a demonização do PT, levando em consideração também que tal processo nega o legado histórico do Partido dos Trabalhadores na construção de um projeto político nascido nas bases populares e identificado com a inclusão e a justiça social. Os que afirmam o nascimento de um “império da iniquidade”, com uma possível vitória do PT nas atuais eleições, “esquecem” o fundamental papel deste partido em projetos que trouxeram mais justiça para a nação brasileira, como, por exemplo: na reorganização dos movimentos trabalhistas, ainda no período da ditadura militar, visando torná-los independentes da tutela do Estado; na implantação e fortalecimento do movimento agrário-ecológico dos seringueiros do Acre pela instalação de reservas extrativistas na Amazônia, dirigido, na década de 1980, por Chico Mendes; nas ações em favor da democracia, lutando contra a ditadura militar e utilizando, em sua própria organização, métodos democráticos, rompendo com o velho “peleguismo” e com a burocracia sindical dos tempos varguistas; nas propostas e lutas em favor da Reforma Agrária ao lado de movimentos de trabalhadores rurais, sobretudo o MST; no apoio às lutas pelos direitos das crianças, adolescentes, jovens, mulheres, homossexuais, negros e indígenas; e na elaboração de estratégias, posteriormente transformadas em programas, de combate à fome e à miséria.

Atualmente, na reta final do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, vemos que muita coisa desse projeto político nascido nas bases populares foi aplicado. O governo Lula caminha para seu encerramento apresentando um histórico de significativas mudanças no Brasil: diminuição do índice de desemprego, ampliação dos investimentos e oportunidades para a agricultura familiar, aumento do salário mínimo, liquidação das dívidas com o FMI, fim do ciclo de privatização de empresas estatais, redução da pobreza e miséria, melhor distribuição de renda, maior acesso à alimentação e à educação, diminuição do trabalho escravo, redução da taxa de desmatamento etc. É verdade que ainda há muito a se avançar em várias áreas vitais do Brasil, mas não há como negar que o atual governo do PT na Presidência da República tem favorecido a garantia dos direitos humanos da população brasileira, o que, com certeza, não aconteceria num “império de iniquidade”.

Está ficando cada vez mais claro que os pregadores que anunciam dos seus púlpitos o início de uma suposta amplitude do mal, numa continuidade do PT no Executivo Federal, são os que estão com saudade do Brasil ajoelhado diante do capital estrangeiro, produzindo e gerenciando miséria, matando trabalhadores rurais, favorecendo os latifundiários, tratando aposentados como vagabundos, humilhando os desempregados e propondo o fim da história.

Enfim, a Aliança de Batistas do Brasil vem a público levantar o seu protesto contra o processo apelatório e discriminador que nos últimos dias tem associado o Partido dos Trabalhadores às forças da iniquidade. Lamentamos, sobretudo, a participação de líderes e igrejas cristãs nesses discursos e atitudes que lembram muito a preparação das fogueiras da inquisição.

Maceió, 10 de setembro de 2010.

Pastora Odja Barros Santos - Presidente
Pastores/as batistas membros da Aliança
Pr. Joel Zeferino _ Igreja Batista Nazaré – Salvador-BA
Pr. Wellington Santos – Igreja Batista do Pinheiro – Maceió-AL
Pr. Paulo César – Igreja Batista Bultrins – Olinda –PE
Pr. Paulo Nascimento – Igreja Batista da Forene – Maceió-AL
Pr. Reginaldo José da Silva – Igreja Batista da Cidade evangélica dos órfãos – Bonança-PE
Pr. Waldir Martins Barbosa – Ig. Batista Esperança
Pr. Silvan dos Santos – Igreja Batista Pinheiros – São Lourenço da Mata- PE
Pr. Marcos Monteiro – Comunidade de Jesus – Feira de Santana – BA
Pr. João Carlos Silva de Araujo - Primeira Igreja Batista do Recreio
Pra. Marinilza dos Santos - Igreja Batista Pinheiros – São Lourenço da Mata- PE
Pr. Adriano Trajano – Chã Preta – AL
Pr. Pedro Virgilio da Silva Filho - Serrinha BA
Pr. Gilmar de Araújo Duarte - PIB Brás de Pina – RJ
Pr. Alessandro Rodrigues Rocha - SIB Petrópolis, Petrópolis RJ
Pr. Nilo Tavares Silva - Igreja:Batista em Praça do Carmo, Rio de Janeiro RJ
Pr.Luis Nascimento - Princeton, NJ – USA
Pr.Raimundo Barreto – USA"



Fonte:

http://www.koinonia.org.br/tpdigital/detalhes.asp?cod_artigo=421&cod_boletim=23&tipo=Artigos em 28/01/2011

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Para não pensarem que desisti!

Deixo com vocês um trecho do livro Christian Anarchy, de Vernard Eller:

"'Existe, então, uma política cristã de paz válida?'
Essa pergunta é feita de maneira errada, então deve ser respondida com um não. Lembremos o quão inflexível Barth foi ao se colocar contrário a qualquer programa ou partido que levasse o adjetivo 'cristão', ou 'religioso', e que tentasse usar esse adjetivo como uma recomendação de sua verdade e superioridade. Programas políticos cristãos são tão impossíveis quanto fórmulas matemáticas cristãs ou receitas de bolo cristãs.
Vamos tentar de novo: 'Existe, então, uma política de paz válida, da qual cristãos possam participar conscientemente?'
Com certeza! Não há nem mesmo motivos para negar que pode ser a teologia cristã da paz que o leve a participar de algum esforço político. Porém, enquanto engajado neste esforço, o cristão é obrigado a participar como um simples cidadão (uma entidade política), não tomar posições enquanto cristão. Toda proposta feita precisa ser justificada no plano político, humanamente possível de se alcançar por meios particularmente humanos – não no plano de que Deus ordena e promete que fará. É a mesma coisa que um cristão que seja físico, mas ele mantém suas teorias físicas dentro dos limites humanos e não tenta melhorá-las recorrendo aos milagres de Deus. Os limites dos discurso devem ser respeitados: enquanto estiver fazendo teologia, deve-se falar de Deus; quando se fizer política, não se deve falar de Deus."